A verdade é que os tempos que vivemos parecem ser de excepção. Não que a humanidade nunca tenha vivido crises – parecemos, pelo contrário, nunca ter vivido sem elas – nem que esta tenha de ser muito diferente das outras. O que importa assinalar, pelo menos se considerarmos que a crise é um sinal de ruptura em relação a qualquer ordem anteriormente estabelecida que se desenvolveu de forma mais ou menos estável durante um determinado período de tempo, é que:-1) algo de decisivo está a mudar, embora não se saiba bem em que sentido; 2) o vento da mudança assinala as contradições da situação anterior, negando-a e abrindo espaço para algo de diferente; 3) a situação é tão mais grave quanto piores forem as suas consequências. É claro que para poder aferir da gravidade da situação teremos que estabelecer critérios para tal. Um critério mínimo e evidente, no contexto de uma crise que assume contornos sociais gravíssimos, é o do sofrimento.
A crise económica e financeira de 2008 que começou, como é bem sabido, com o rebentar da bolha especulativa do mercado imobiliário americano e cujas ondas de choque, partindo de Wall Street, têm atingido o mundo inteiro e revelado as debilidades estruturais de inúmeras economias – curiosamente, com maior incidência nas economias dos países “desenvolvidos” da Europa – tem tido, como consequência evidente, o alastrar de uma crise social de proporções só comparáveis às da Grande Depressão dos anos 30. Neste contexto, a Filosofia, sem prejuízo da sua especificidade e da sua independência pode – e deve – acrescentar o seu contributo para o diagnóstico e a discussão desta situação, cuja gravidade é evidente.
Ética, Crise e Sociedade, Michel Renaud (coord.), Gonçalo Marcelo (coord.), Vila Nova de Famalicão: CHC, Húmus, 2011, 454p., (Extra Colecção)
ISBN
9789898139900