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CAPES - Uma cidade, vários territórios e muitas culturas. Salvador da Bahia e o mundo Atlântico, da América portuguesa ao Brasil República
 

 

 


Início   .   2014
Duração   .   20 meses
Investigadores Principais  .   Pedro Cardim (CHAM)   .   Evergton Sales Souza (UFBA)

 

Instituições

Entidade(s) Financiadora(s)

Fundação para a Ciência e a Tecnologia
 

Entidade(s) Promotora (s)

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa

Universidade Federal da Bahia

 

Unidade de Investigação Principal

CHAM — Centro de Humanidades

 

 

 
 
 

O projecto CAPES tem como finalidade converter a Bahia num observatório das mudanças políticas, sócio-económicas e culturais que marcaram a história do mundo atlântico, abarcando, sobretudo, o período colonial, mas também o tempo do Brasil independente. Trata-se de uma proposta de trabalho que se encontra vinculada a um projecto que está em curso, intitulado «Salvador da Bahia: American, European, and African forging of a colonial capital city (BAHIA 16-19)» uma iniciativa conjunta da UFBA e do CHAM financiada pelas Marie Curie Actions (PIRSES-GA-2012-318988). Pretende-se alargar o escopo da investigação, incidindo nas dinâmicas internas e externas de construção do mundo brasileiro, desde a sua formação administrativa inicial – o Estado do Brasil – até ao Brasil dos séculos XIX e XX. Além disso, através do envolvimento de jovens investigadores, em especial não-doutorados, este projecto irá contribuir para a sua formação na área da história do mundo atlântico.

O presente projeto visa articular a pesquisa em torno de três eixos temáticos: cidade, território e cultura, que privilegiam o estudo da cidade da Bahia em si mesma e em sua relação com outros espaços. A Bahia oferece um ponto de convergência para as diversas análises a serem empreendidas pelas equipes de pesquisadores cujos interesses se estendem por um horizonte cronológico bastante amplo. Parte-se de um momento, o período colonial, em que as análises se fazem num quadro espacial mais vasto, derivado da importância e centralidade daquela que era a cabeça do Estado do Brasil e principal centro da América portuguesa, o que a implicava necessariamente numa complexa teia de relações com o restante da América e com a África. O ponto de chegada indica o interesse pelos estudos sobre as restruturações sociais e políticas que caracterizaram o Brasil das últimas décadas do século XIX até meados do XX, período marcado tanto pelo fim da escravidão e da monarquia quanto pelo advento da República, com sua pretensa ordem e seu desejo de progresso. Naquele contexto, o distante passado colonial, bem como o passado escravista, há pouco desfeito, eram relidos por diversos atores sociais: literatos, lideranças políticas negras e governantes.

Os eixos temáticos propostos permitem a articulação de problemas de natureza institucional, social, política e cultural, oferecendo uma oportunidade singular para a troca de ideias em busca de uma visão mais abrangente e atenta às múltiplas interações que se escondem por detrás de cada aspecto da realidade estudada.

Espaço urbano geograficamente situado, a cidade, ainda mais a capital, é polo político, econômico e religioso, teatro de representações de poderes que, nas celebrações festivas, assim como nas construções arquitetônicas e artísticas, buscam exibir sua potência, mas também sua opulência. No seu seio se desenvolvem as tensões proporcionadas pela afluência de diferentes povos, que alimentam expectativas as mais diversas. Tensões particularmente acesas devido ao grande contingente de indivíduos brutalmente arrancados de seus locais de origem e de suas famílias, que precisarão se reinventar num ambiente hostil para suportar a escravidão e buscar novo sentido para as suas vidas. A concentração de escravos africanos e afrodescendentes fará de Salvador um espaço particularmente perigoso, propício às revoltas, mas também contribuirá para a gestação de uma sociedade profundamente marcada pelos processos de miscigenação biológica e cultural que estarão na base de suas complexas clivagens socioculturais.

A cidade não cabe em si, ela necessariamente expande sua força muito além de suas fronteiras. Num movimento centrípeto ela atrai os fluxos do comércio de sua hinterlândia, mas também de zonas mais distantes, seja no interior da América portuguesa – pensemos no caso do gado bovino, trazido do longínquo Piauí para abastecer a cidade –, seja na outra margem do Atlântico, com o trato dos viventes de Angola e da Costa da Mina. Também atrai, por conta de seus tribunais de segunda instância, tanto no civil quanto no eclesiástico, o fluxo de grandes litígios e também a disputa por ofícios e benefícios prestigiosos e lucrativos. Convergem para ela os fluxos da comunicação que permitem ao governo-geral dotar-se de informação sobre a situação dos diferentes espaços da América portuguesa, reforçando seu poder de governação e de conselho junto à coroa. Dela partem, num movimento centrífugo, modelos normativos como as Constituições do arcebispado da Bahia, adotadas mesmo em dioceses que não lhe eram sufragâneas, como as do Maranhão e do Pará. Dela podiam emanar decisões importantes para a repressão de quilombos que ameaçavam a ordem escravocrata, bem como resoluções que tiveram um enorme peso no destino de numerosas populações indígenas, a exemplo do que ocorreu na conquista e colonização dos sertões baianos a partir de meados do século XVII. Do mesmo centro podiam partir auxílios materiais a outras regiões fosse para garantir a defesa do território, fosse, por exemplo, para ajudar no sustento de estruturas administrativas de regiões mais pobres, a exemplo do auxílio financeiro pago pela provedoria da fazenda da Bahia às dioceses amazônicas cujos dízimos e demais impostos foram momentaneamente insuficientes para fazer face às despesas do civil e do eclesiástico.

A mudança da capital do Estado do Brasil para o Rio de Janeiro não impactou severamente a importância da cidade da Bahia. O declínio foi se fazendo sentir lentamente, ao longo do século XIX. Nos anos 1930, marco cronológico final deste projeto, riquezas, glórias e capacidade de exercer comando ou influência nos destinos do Brasil eram apenas imagens de um passado longínquo. Mas como os diversos atores se portaram diante dos novos tempos? Como a massa de negros e mulatos, outrora escravizada, buscou se inserir no novo quadro criado com a transição para o trabalho livre?É também a estas questões que o presente projecto procurará dar resposta.

 

 

Objectivos

É objectivo deste projecto estudar, numa perspectiva global, as circulações, as articulações e as interacções entre o Brasil, a África ocidental e a Europa. Apoiando-se na importante renovação historiográfica destas últimas décadas sobre a América portuguesa, marcada tanto pela incorporação de uma perspectiva africana, quanto pela superação da relação dicotómica entre o Brasil e a metrópole, este projecto de investigação combina várias abordagens, cruza história cultural e história social dos poderes, ambicionando contribuir para a história do Brasil durante o período colonial e contemporâneo e colocar em contacto historiografias até agora separadas.

Ao mesmo tempo, adoptar Bahia como tema de estudo permite instaurar uma pesquisa com uma forte dimensão comparativa e cruzada, tornando-se assim possível extravasar os estreitos limites das histórias coloniais nacionais. Pretende-se assim:

. colocar em contacto distintas tradições historiográficas;

. privilegiar as interacções e levar a cabo uma démarche transnacional;

. efectuar um estudo que permita a variação de escalas;

. experimentar a variação de pontos de vista, combinando – e confrontando – o olhar europeu com o americano e o africano.

 

A investigação aqui proposta assenta em três principais eixos:

 

A) SALVADOR DA BAHIA E O MUNDO ATLÂNTICO PORTUGUÊS

 

. As estruturas institucionais, políticas e eclesiásticas vigentes no Estado do Brasil;

. As estratégias de legitimação e as relações com as populações autóctones e africanas;

.  O papel do governo-geral da Bahia, da câmara municipal e dos poderes locais;

. A questão da capitalidade da Bahia e os processos de sua construção ao longo do tempo;

. A interacção entre o Estado do Brasil e o Estado do Maranhão e do Pará;

. A interacção entre o arcebispado da Bahia e as dioceses sufragâneas.
 

B) A BAHIA ENQUANTO LUGAR DE INTERACÇÃO CULTURAL

 

. A pluralidade das práticas e das culturas presentes no espaço da Bahia e suas interrelações;

. As relações e as tensões entre as diferentes culturas, as suas interacções e as recomposições identitárias;

. Os significados simbólicos do diálogo estabelecido entre os diferentes agentes locais manifestado através das artes, mas também mediante a arquitectura efémera, o ceremonial, as entradas solenes, as festas e as procissões;

. A relação com a Europa e, em especial, com Portugal, como um processo criativo: a centralidade de Salvador, quer como capital politico-religiosa, quer como encruzilhada de rotas, transforma a cidade num lugar muito dinâmico de recepção, de transformação e de redistribuição das formas;

. As relações entre a cidade de São Salvador, o Recôncavo e os sertões baianos.
 

C) A BAHIA ESCRAVISTA E DO PÓS ABOLIÇÃO: SÉC. XVIII -XX

 

. O modo como a escravidão e o mundo do Antigo Regime estiveram intrinsecamente ligados e conviveram na América portuguesa;

. O processo de abolição da escravidão, seus desdobramentos na Bahia, mas também os seus impactos atlânticos a partir da sociedade baiana;

. A ações e estratégias políticas e culturais das populações escravizadas e libertas, as reivindicações e formas de ascensão social e disputas por cidadania protagonizadas por pessoas de cor nos séculos XVIII, XIX e XX;

. As dinâmicas de mestiçagem, o problema da raça como operador de diferenciação, e, ainda, a racialização dos processos políticos e sociais na Bahia entre os séculos XVII e XIX;
. Os trabalhadores da Bahia e a formação da classe trabalhadora no pós-abolição.

 

Equipa
 

 

 
Pedro Cardim   .  Coordenador 
Evergton Sales Souza   .  Coordenador 
Ana Paula Medicci (UFBA)
António Castro Nunes (UÉ)
Antonio Luigi Negro (UFBA)
Camila Teixeira Amaral (NOVA FCSH)
Daniele Santos Souza (UFBA)
Ediana Ferreira Mendes (UC)
Gabriela dos Reis Sampaio (UFBA)
Hugo Ribeiro da Silva
Jaime Gouveia
João José Reis (UFBA)
Ligia Bellini (UFBA)
Lívia Carvalho Pedro (UFBA)
Luis Nicolau Pares (UFBA)
Marcelo Souza Oliveira (UFBA)
Miguel Geraldes Rodrigues (EUI)
Nuno Vila-Santa (NOVA FCSH)
Patrícia Mota Sena (UFBA)
Ricardo Santos Batista (UFBA)
Tânia M. Pinto de Santana (UFBA)
Wlamyra Ribeiro de Albuquerque (UFBA)