Início . 2017
Duração . 12 meses
Investigador Principal . David Martín Marcos (Universidad Nacional de Educación a Distancia)
Instituições
Entidade Financiadora
Fundação Calouste GulbenkianUnidade de Investigação Principal
CHAM — Centro de HumanidadesParcerias
Arquivo Nacional da Torre do Tombo / Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das BibliotecasBiblioteca Nacional de Portugal
Laboratório HERCULES / Universidade de Évora
Os desenhos de Duarte de Armas foram o resultado da incumbência do rei D. Manuel I para que percorresse as fronteiras do reino de Portugal, retratando o estado das fortalezas que defendiam os confins com Castilha. «O Livro das Fortalezas (c.1509), roteiro de paisagens culturais” é um projecto multidisplinar, que visa analisar, valorizar e divulgar a actividade pictórica de Duarte de Armas. Pretende-se desenvolver um estudo integral dos manuscritos ANTT CF159 e BNE mss. 9241, assim como da cópia seiscentista BNP IL192, da autoria de Brás Pereira. Este estudo incidirá na análise dos materiais pictóricos usados nas suas produções e na investigação sobre a politização e apropriação da paisagem inerentes aos mesmos como evidências de sucessivos contextos de auto representação do poder.
O estudo material dos três exemplares referidos basear-se-á em técnicas de análise molecular e estrutural de compostos químicos, e no uso da fotografia e microfotografia recorrendo à radiação electromagnética. Estas técnicas permitirão, através de uma metodologia jamais utilizada pelos investigadores que estudaram a obra de Duarte de Armas e do escriba Brás Pereira, conhecer com rigor detalhes sobre a execução dos desenhos presentes nos ditos manuscritos. Por outro lado, para além de se considerar os manuscritos de Duarte de Armas instrumentos de poder que canalizariam informação e conhecimentos sobre o território, pretende-se evidenciar as referências feitas aos desenhos, no âmago da cultura política da Idade Moderna. Mediante uma pesquisa em torno à literatura política, irá demonstrar-se o seu uso tanto em processos de legitimação política como em contextos de afirmação de identidade vinculados ao espaço geográfico.
Da mesma forma, o projecto, na sua vertente espacial e para uma melhor compreensão do trabalho de Duarte de Armas, ambiciona identificar os lugares exactos desde os quais foram executadas cada uma das vistas das fortalezas no século XVI, mediante pesquisas no terreno. Isso permitirá recriar a viagem do autor e também estabelecer as bases para um estudo da evolução da paisagem desde a época do Livro das Fortalezas até à actualidade. Mediante um levantamento fotográfico será igualmente possível realizar um estudo sobre a perspectiva essencial – tamanhos e distâncias – empregue por Duarte de Armas nos seus desenhos. Os resultados indicarão quais os seus conhecimentos técnicos e tornarão possível a detecção, na paisagem actual, de elementos representados pela sua mão no Livro das Fortalezas. Este tipo de procedimentos será ainda enriquecido mediante uma nova recreação dos monumentos recolhidos por Duarte de Armas através do desenho artístico contemporâneo. Este recurso, junto com técnicas próprias da História Oral para detectar processos de patrimonialização, servirá como base para uma reflexão sobre a diferença entre as linhas fronteiriças dentro do espaço Schengen, assim como sobre a situação actual de espaços que num passado foram estratégicos e que hoje carecem dessa característica mas que podem obter novas características atractivas a partir da valorização do património.
Objectivos
Estudos sobre os materiais. São objetivos do projecto 1) detectar se os manuscritos da Torre do Tombo e da Biblioteca Nacional de Madrid, que foram provavelmente executados no ano 1509, correspondem somente à mão de um único autor – Duarte de Armas – ou se pelo contrário apresentam diferenças caligráficas, resultado de distintas intervenções; e 2) se os manuscritos tiveram adendas posteriores que poderiam ter alterado as representações da paisagem que neles se retrataram e que chegaram até nós. No terceiro manuscrito, a cópia de Brás Pereira, datada do ano 1642, o objectivo deste estudo será, por ser um exemplar composto por desenhos com cor e por isso diferente dos anteriores, conhecer quais foram os pigmentos ou corantes usados, assim como o valor deles e qual o significado que daí advém para a obra. O retorno aos desenhos de Duarte de Armas, mais de um século depois da sua execução e em plena Guerra da Restauração, evidencia, de facto, o valor simbólico do Livro das Fortalezas, algo que este estudo ambiciona constatar através da detecção de materiais diferenciados na sua execução.
Patrimonialização e criação de um itinerário cultural. Em Portugal, sobretudo a partir dos anos 60 do século XX, os meios rurais – dentro dos quais se situam grande parte dos territórios de fronteira – entram num processo de transformação com perda demográfica e retração do cultivo dos solos. Num contexto de pós-ruralidade, as entidades políticas nacionais, mas também as populações e as entidades locais, sentem necessidade de atribuir novas valências a estes espaços. Por um lado, é necessário garantir a existência de símbolos capazes de representar a identidade dos grupos sociais em questão, por outro é preciso assegurar estratégias que permitam manter a sobrevivência dos territórios e promover o seu desenvolvimento socioeconómico. Respondendo ao aparecimento de novos «públicos» (turistas, emigrantes que retornam, etc.) e a mudanças nos padrões de consumo, generaliza-se a patrimonialização das ruralidades. O património edificado, juntamente com outros, adquire então um papel importante na execução destes objetivos. A criação de um itinerário cultural ao longo da fronteira, tomando como referência a experiência de Duarte de Armas, será desde o ponto de vista da divulgação o grande legado do projecto. Para tal, o impulso será dado mediante a criação de uma exposição itinerante ao longo de todas as fortificações do Livro das Fortalezas em que estariam representados tantos os desenhos quinhentistas de Duarte de Armas como as recriações contemporâneas dos mesmos, realizadas durante o período de execução do projecto. Desta forma, optar-se-á por uma estratégia de valorização do legado de Duarte de Armas estreitamente ligado ao território e à população actual.
Ana Claro (CHAM)
António Candeias (UÉ)
Márcia Almada (UFMG)
Marta Silva (IHC / NOVA FCSH)